quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Ferroanel depende de acordo com iniciativa privada


 Entrevista com Bernardo Figueiredo da ANTT


A meta é tirar os trens de carga de dentro da 
Região Metropolitana de São Paulo, 
abrindo espaço para o transporte de passageiros

A implantação do Ferroanel na Região Metropolitana de São Paulo já está em fase final de negociação entre o governo federal, governo do estado e iniciativa privada. De acordo com Bernardo Figueiredo, diretor Executivo da Agência Nacional dos Transportes Terrestres (ANTT), as obras devem ser iniciadas pelo trecho norte, acompanhando o traçado do tramo norte do Rodoanel. O objetivo é amenizar as intervenções no meio ambiente, principalmente no que diz respeito à região sul da Grande São Paulo, com grande reserva nativa de Mata Atlântica e mananciais importantes como as represas Billings e Guarapiranga. 

Com pouco mais de 70 quilômetros de extensão, todo em bitola larga, o ferroanel, previsto no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), do governo federal, deverá promover a ligação ferroviária entre as principais ferrovias que cortam a grande São Paulo, na tentativa de fazer uma conexão direta e uma modernização no transporte ferroviário da região, que sofre com o abandono de investimentos há meio século. Além disso, pretende-se fazer com que o transporte de carga deixe de passar pelos trilhos da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), operadora do transporte de passageiros da Região Metropolitana. A meta da ANTT é inaugurar pelo menos esse trecho norte em 2015, quando todos os trens da CPTM operarão com intervalos de três minutos. A coexistência do sistema de carga e de passageiros nos mesmos trilhos poderá causar um conflito ainda maior na região, inviabilizando ambos. 

Para acelerar o empreendimento, as licenças ambientais do Rodoanel Norte já estão considerando uma faixa de domínio 30 metros maior, de forma a aproveitar o traçado para o Ferroanel.

Nessa entrevista, Bernardo Figueiredo fala das complexas negociações envolvendo a MRS Logística, operadora privada do transporte ferroviário de carga, que detém a concessão da malha na região, identificada como parceira preferencial para uma PPP envolvendo o ferroanel. Ele fala ainda dos custos, vantagens e dificuldades para tornar o projeto realidade. 

Grandes Construções – E quais são as novidades em torno da execução do projeto do ferroanel de São Paulo? 

Bernardo Figueiredo – O Ministro dos Transportes tem mantido várias conversas com o Secretário de Transportes Metropolitano de São Paulo, no sentido de esclarecer o que se pretende com o projeto, e entraram em um consenso. Nesse momento, nós estamos trabalhando tendo como prioridade a construção do trecho Norte do Ferroanel que, a princípio, vai ser construído em paralelo ao trecho Norte do Rodoanel de São Paulo, passando em seguida para um novo trecho de ferrovia segregado à malha dos trens de passageiros da CPTM. Inicialmente, apresentamos um projeto para a brealização do empreendimento em parceria com a iniciativa privada, no caso, com a MRS Logística, que é a concessionária da Malha Sudeste da ferrovia, e que corta a região. O que ocorreu foi que, naquele primeiro momento, as discussões com a MRS não chegaram a um termo adequado, não evoluíram como esperávamos. Por isso começamos a repensar o modelo do Ferroanel, mas não paramos de negociar com a MRS. Hoje essas discussões estão bem mais avançadas. 

Grandes Construções – As negociações avançaram em que direção? 

Bernardo Figueiredo – A MRS Logística elaborou, por solicitação do governo do estado de São Paulo, um projeto de engenharia e a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) contratou um estudo de viabilidade econômica e financeira, a partir de alguns parâmetros estabelecidos para a operação do trajeto. Esse estudo deverá ser concluído em janeiro e nós vamos modelar o processo de construção em parceria com a iniciativa privada. A nossa expectativa é a de que possamos realizar esse empreendimento em parceria com a MRS Logística. 

Grandes Construções – Mas por que com essa parceria tem de ser prioritariamente com a MRS? 

Bernardo Figueiredo -- O Ferroanel é um projeto que se insere na concessão ferroviária da MRS Logística. Mas não é uma obrigação da concessionária executá-lo. Então, a primeira ideia é fazer uma negociação com a concessionária para ver a possibilidade de contar com a parceria dela na construção do Ferroanel. Mas podemos realizar o projeto sem a MRS, até mesmo com outra operadora. Depende muito da MRS aceitar as condições como favoráveis aos seus interesses. Vamos continuar a conversa com a concessionária, mas, paralelamente, pensar modelos alternativos para a implementação. O que não há dúvida é de que é um projeto importante e que existe a determinação do Governo Federal para que seja implementado. O objetivo nosso, tanto do governo federal quanto do governo do estado de São Paulo é que essas linhas, que hoje cortam a região metropolitana e que são compartilhadas entre o transporte de carga e de passageiros, sejam liberadas exclusivamente para o transporte de passageiros já a partir de 2015. E para que isso seja possível, é necessário que até lá nós tenhamos algum dos dois tramos do ferroanel pronto. 

Grandes Construções – Não seria necessário fazer um processo de licitação para a escolha desse parceiro privado para a realização do empreendimento? 

Bernardo Figueiredo – Não necessariamente. Se for possível viabilizar esse projeto através de uma pactuação com a MRS não seria preciso, porque essa possibilidade já está prevista no contrato original de concessão da MRS. 

Grandes Construções – Esse trecho que irá compor o ferroanel seria então incorporado à malha concessionada à MRS? 

Bernardo Figueiredo – Na verdade, para construir o ferroanel nós estaremos tirando um trecho da linha que hoje está sob a concessão da MRS. Então, teoricamente, se ela entrar na parceria, o ferroanel, uma vez construído substituiria esse trecho. 

Grandes Construções – E o que acontece se essa concessionária definitivamente não aceitar a parceria? 

Bernardo Figueiredo – Se a gente só tirasse esse trecho da malha da MRS, ela teria direito a uma análise do que isso geraria de impacto no equilíbrio econômico-financeiro da sua concessão, para efeito de ressarcimento. Mas se, no lugar do trecho retirado da malha, eu ofereço a ela a alternativa de utilização de um infraestrutura ainda mais eficiente do que a atual, para que ela entre no estado de São Paulo, eu posso estar oferecendo à MRS condições até mais favoráveis à sua operação. A única dúvida, nessa negociação é que essa nova infraestrutura poderá ser incorporada à malha da MRS, se ela aceitar as condições da negociação. 

Grandes Construções – Quais são as bases para essa negociação? 

Bernardo Figueiredo – Pelos cálculos do BNDES, o projeto do tramo Norte custaria R$ 1,5 bilhão. Para que o empreendimento aconteça no ambiente da parceria público-privada, caberá à concessionária uma contrapartida. Se o governo avaliar que essa participação é interessante, a parceria é viabilizada. Mas ela também poderá ser viabilizada com outros parceiros privados. Nós estamos preparando uma modelagem de ferrovia separando a infraestrutura da operação e prestação de serviço. Nós poderemos até testar esse modelo, se não houver acordo. Se for concretizado o acordo com a MRS, ela passa a ser a concessionária do ferroanel, com direito a cobrar das demais operadoras ferroviárias o direito de passagem para entrar em São Paulo. Se não houver acordo, a MRS passa a ser apenas mais uma usuária com direito de passar no trecho novo.  Para ser construído, o trecho Norte do ferroanel terá que ter duas segregações em relação à linha de passageiros. Uma na região de Mogi e outra de raiz da Serra até o Ipiranga. Uma segregação já está em andamento, que a MRS está fazendo por sua própria conta e risco, e a outra já está definida. Nós só precisamos ver quem a fará. Hoje nós estamos, junto a CPTM, justamente definindo a questão da separação dos ativos desse trecho. 

Grandes Construções – Quais as possibilidades da MRS aceitar participar do empreendimento, em condições aceitáveis para o governo? 

Bernardo Figueiredo – Veja bem: a decisão do Governo Federal de fazer o anel ferroviário atende ao interesse público de retirar trens de carga do centro da cidade (de São Paulo), criar condições para expansão do sistema metropolitano e gerar ganhos de capacidade e produtividade para ferrovia. Esse é o interesse público. Mas existe também o interesse privado da MRS, que diz respeito às várias restrições para circulação de trens pela área central de São Paulo. A MRS vai ganhar com o projeto, porque vai aumentar sua capacidade e produtividade, além de diminuir custos. Nós temos que captar, para ajudar a financiar o projeto, esse ganho privado que ele gera, e tentamos negociar com a MRS. 

Grandes Construções – Qual o percentual de participação para a MRS que o governo considera aceitável ?

Bernardo Figueiredo – Nós estamos concluindo o estudo de viabilidade. E o que orienta esse estudo é o fato de que hoje a MRS passa cerca de 5 milhões de toneladas dentro de São Paulo, com velocidade reduzida e grandes limitações de horários. O ferroanel vai permitir que a concessionária passe com 40 milhões de toneladas. Ou seja, ele gera o benefício que é o aumento da capacidade de transporte – mais trens com um custo operacional mais baixo –, sem limitação de horário, o que se traduz em aumento de produtividade. E esses benefícios têm de ser quantificados. A concessionária MRS terá de investir para ter esse conjunto de benefícios. Ela pode perceber que o que ela tem a ganhar corresponde a fazer 20% do investimento, cabendo ao governo arcar com os 80% restantes. É essa negociação que estamos travando. Se a concessionária concordar com os nossos valores, tudo bem. Se ela ficar aquém do que esperamos, se ela tiver uma percepção pior que esta, nõs faremos o projeto de outra forma. 

Grandes Construções – Qual será a extensão do ferroanel? 

Bernardo Figueiredo – Pouco mais de 70 quilômetros, todos em bitola larga. 

Grandes Construções – Mas por que dar prioridade ao tramo norte do traçado? 

Bernardo Figueiredo – Na verdade nós estamos trabalhando com o conceito do anel ferroviário completo. Do meu ponto de vista, o Ferroanel é um conjunto, é um todo. O que a gente está discutindo são as datas de construção. Não existe dicotomia de Ferroanel tramo Norte, Ferroanel tramo Sul. Existe um projeto de fazer um anel ferroviário em São Paulo e o que nós estamos discutindo é por onde ele começa e por onde ele acaba. Estamos estudando uma infraestrutura logística completa para a região de Sâo Paulo. Nós estamos estudando também a questão do acesso ao Porto de Santos, o tramo Norte, mas também o tramo sul do ferroanel. Nosso objetivo, portanto é a realização do ferroanel completo, com plataformas logísticas compatíveis com a movimentação de carga na região e com o acesso adequado ao Porto de Santos, com geração de eficiência. Hoje, um trem chega a demorar 48 horas para descarregar no porto de Santos. Ele gasta 40 horas viajando e mais 48 horas esperando descarregar. E isso não é aceitável. Nós temos que mudar essa realidade. Por isso é que o ferroanel tem de ser visto como uma solução integrada.

Um comentário:

  1. Desenvolvimento com políticas ambientais sustentáveis, não são coisas antagônicas. Qualquer pessoa com um mínimo de noções culturais sabe que investimentos em transporte, saneamento básico, urbanismo e infra-estrutura só trazem o progresso por onde passam. Os fatos refletem isto, o atual rodoanel sul não permite ligações periféricas secundárias em seu contorno, e que atravessa inúmeros mananciais, e o futuro norte estão levando em conta estas importantíssimas questões. Com todo respeito, acreditar que o único caminho viável é deixarmos do jeito que está, é no mínimo falta de informação.
    Dentre as obras do PAC, uma que deveria estar incluída e ser priorizada é ligação rodo ferroviária Parelheiros–Itanhaém, uma vez que o porto de Santos ultrapassou seu limite de saturação com filas de navios em de mais de 60 unidades, das quais podem ser avistados da Vila Caiçara em Praia Grande, além de que a Via Anchieta por ser a única via de descida permitida para ônibus e caminhões tem registrados congestionamentos e acidentes graves semanalmente, como este de hoje 22/02/2013 em que uma trompa d’agua na baixada paulista deixou o sistema Anchieta / Imigrantes em colapso, e o transito só foi restabelecido na madrugada do dia 24 seguinte, e em épocas de escoamento de safras também a Dom Domenico Rangoni (Piaçaguera–Guarujá) se torna congestionada diariamente, ao contrário da Manoel da Nóbrega, onde somente se fica com problemas em épocas pontuais na passagem de ano, ao porto de Santos, e os futuros portos de Itanhaém / Peruíbe.
    Acredito também, como munícipe, que a estrada mitigaria as condições de estagnação que as cidades vivem, com ruas sem pavimentação, ocupação desordenada do solo, entre outras. Uma ligação da cidade com a região sul da capital traria muitos benefícios, fornecendo mais opções, melhorar a qualidade de vida dos moradores da capital e baixada. Muitas pessoas voltariam a fixar na cidade, inclusive eu. A cidade poderia nos dar mais retorno frente aos impostos que pagamos. Investimentos em Parques Temáticos, Porto, Aeroporto, Ferrovia ligando com a existente, enfim muitos projetos que alavancariam a região como um todo, bem como o desenvolvimento global de toda a região.
    Enquanto outras cidades turísticas litorâneas avançam principalmente no norte fluminense, Itanhaem, Mongaguá e Peruíbe se voltam ás primitivas cidades sazonais caiçaras sem interesse em desenvolvimento e com metas e avanços financeiros presentes apenas nas mãos de alguns.
    Já passou á hora de ver nossa geração e de nossos filhos se enraizarem na região com bons empregos e educação ao invés de tentar uma melhor condição social em São Paulo, pois Santos também já ultrapassou o limite de saturação.
    Com relação Parelheiros, esta região rural situada ao sul do município de São Paulo, a região que possui uma carência de saneamento básico, ajudaria enormemente uma fiscalização, urbanização e preservação dos seus mananciais.
    Sinto que o potencial destas cidades não são utilizados, com foco noutros que beneficiam uma minoria retrógrada. Não vejo senão, o apoio irresponsável e egoísta aos interesses escusos.

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